Estudo desenvolvido pela SAER e pela Caixa Geral de Depósitos, intitulado Cidades e Desenvolvimento, apresenta um "diagnóstico e linhas de acção no sentido das autarquias e cidades poderem continuar a ser um factor decisivo na geração de riqueza económica, na melhoria da qualidade de vida das populações e na sua sustentabilidade".
Segundo o Diário Económico «o estudo apresentado na passada sexta-feira faz uma avaliação da situação dos municípios e apresenta algumas sugestões para que as cidades se concentrem na produção de riqueza para conseguir competir ao nível internacional. "A cidade tem de ter uma posição nos fluxos internacionais, senão definha, afirmou Poças Esteves, o coordenador do estudo.»
Estando direccionado para a análise da situação actual dos municípios portugueses e apresentando propostas que visam novos modelos de financiamento/risco e de gestão além de propostas na área da boa governação dos municípios, algumas das análises e conclusões podem ser adaptadas ao nível de Freguesias, permitindo assim que a este nível autárquico possam também ser introduzidas alterações que levem a uma melhor e mais transparente gestão.
Uma síntese das principais conclusões do estudo pode ser consultado no site da Caixa Geral de Depósitos
2 comentários:
Caro amigo,
Não tive mais do que o tempo necessário para dar uma olhada en passant à síntese (e não ao estudo), ainda assim, não resisto a fazer algumas notas:
Começando pelo prefácio, não está comprovado que o modelo “autárquico nos últimos 35 anos teve efeitos e mérito altamente positivos” (...) nem está igualmente provado que tal seja “indiscutível”. Pelo menos na síntese não o está, talvez esteja no estudo - o que duvido, diga-se em abono da verdade!
Seguidamente, é referida a mudança de paradigma cultural de ópitca distributiva para a cultura promotor-investidor. Esta traduzir-se-á: (adopção de novas forma de financiamento que não impliquem aumento de endividamento e permitam atrair novas classes de investidores. Será isto possível?
Financiamento é uma operação financeira em que a parte financiadora, fornece recursos para outra parte que está sendo financiada, de modo que esta possa executar algum investimento específico previamente acordado. Ou dizendo de outra forma, não existe financiamento sem endividamento. O que pode acontecer é que esse endividamento seja contabilizado fora do perímetro da contabilidade pública (vulgo desorçamentação) ora, esta foi precisamente a estratégia maioritariamente seguida pelas autarquias locais – e pelo estado central – e é errada porque insustentável. Percebe-se o interesse da CGD, mas é um erro e grave.
Quanto à Cidade: funções e mecanismos: as cidades portuguesas desenvolveram-se de facto numa lógica político-jurídico-administrativa e não numa lógica de auto-sustentabilidade, em termos competitivos no quadro global. Esta é uma caracteristica muito marcada e que pode ser verificada enquanto realidade, já nos livros de história do direito do tempo da outra senhora.
O ponto anterior está ligado, ao ponto 13 (“O novo conveito de cidade/sistema urbano:”), onde os autores constatam que a maioria (das cidades/sistemas) não têm escala. Basta ir ler os livros de Saskia Sassen, para constatar essa realidade. Aliás, o estudo baseia-se no “Global citties” da autora. A presente síntese não apresenta qualquer solução para esta questão, e não o pode fazer, porque como é óbvio, não existe solução a uma falta de escala. Portanto serão sempre players de segunda (estou a ser benévolo) divisão e nunca será possível contrariar esta relativa periferização global por via da escala.
Note-se que os espaços virtuais poderiam dar alguma “folga competitiva”, no entanto, basta verificar os trabalhos de Castells, Emanuel (de resto também utilizados pelo presente estudo) para verificar que as cidades portuguesas não estão, nem de perto nem de longe, em condições de competitividade em termos de intensidade de conectividade. E há razões a montante que explicam isto, mas não são abordadas pela síntese (e provavelmente pelo estudo).
Quanto à governança, gestão e financiamento dos munícípios portugueses (ponto 16), o diagnostico está correcto, mas não é minimamente inovador e não aponta as soluções para este estrangulamento. É evidente que o ambiente institucional é desfavorável à iniciativa (assim de cor e se não me falha a memória há diversos estudos do FMI e da OCDE que o comprovam), mas as medidas concretas que desmontem este estrangulamento é que quase nunca são referidas, e quando o são não são seguidas, porque existe uma parte substancial de actores intramunicipais que subsiste no poder às expensas deste fenómeno. O ponto 17 reflecte a lack of accoutability reinante no país, os munícipios são apenas um reflexo. Mais uma vez existem interesses particulares que se têm vindo a sobrepor ao superior interesse público, e uma das formas mais eficazes de manter estas práticas é precisamente através da ausência de informação/responsabilização. Esta é uma estratégia que poderia ser contrariada pela implementação de avaliação por critérios objectivos, mas a síntese é omissa a este respeito, provavelmente porque isso entraria em linha de colisão com os próprios municípios e com os actores que neles desempenham funções.
No ponto 28 é referido que o valor de activos se encontra subestimado por ausência de inventariação o que é uma verdade a la palisse, mas não é dada importância a dois factores cruciais: a) estes activos não são geradores de rendimentos b) provavelmente os valores porque estão reconhecidos não são valores actuais de mercado, por via de imparidades imobiliárias.
Quanto ao ponto 36, o legislador poderia ter optado por outro tipo de regime. Não é nada de outro mundo ou esotérico e obrigar a uma correcção efectiva dos desvios atempadamente, mas a síntese é omissa quanto a este aspecto. No ponto 37 também se poderia ter ido mais longe, não é dificil ponderar as receitas dos anos anteriores, ao cenário macroeconómico, designadamente através das previsões macroeconómicas do Banco de Portugal. E obrigar a correcções de atempadas dos desvios. A eventual ponderação do efeito estratégico e relevância dos projectos é um verdadeiro alçapão, uma caixa de pandora, onde cabe absolutamente tudo. Os critérios têm que ser objectivos e rígidos.
No ponto 48 preconiza-se O BSC como instrumento de qualidade de gestão. O BSC, na versão original (já é bem velhinho, nasceu nos anos 90) não avalia a qualidade de gestão, mas a performance face aos indicadores, e pode ajudar à definição dos objectivos.
De acordo com Kaplan & Norton (1997): “O BSC leva o conjunto de objetivos das unidades de negócios além das medidas financeiras sumarizadas. Os executivos podem agora avaliar até que ponto suas unidades de negócios geram valor para os clientes atuais e futuros, e como devem aperfeiçoar as capacidades internas e os investimentos necessários em pessoal, sistemas e procedimentos visando a melhorar o desempenho futuro”.
“Para que seja uma ferramenta eficaz e eficiente de medição e melhoria, é recomendável que o BSC seja inserido como um processo do sistema de gestão da qualidade indutor da melhoria contínua, de acordo com a norma ISO 9001:2000, implicando, portanto, a utilização do ciclo PDCA.” De acordo com Mello et al(2002):
De todas as formas, foi escolhida e preconizada a mais subjectiva, há técnicas mais objectivas. Mas mesmo que se quisesse implementar o BSC teria de ser na sua versão dinâmica (vide Major, Maria João).
A presença de pólos académicos, não é o que se pretende, mas sim pólos de desenvolvimento (Pigout) e seria necessário aliar os pólos universitários e de investigação num caldo cultural propício à inovação. Ora isto, (de resto seguidamente tratado pela síntese na página 20) não é fácil, não é barato e não é imediato. Além do mais, é necessário que as universidades tenham escala (a maioria das portuguesas não tem) e estejam inseridas num contexto específico de empresas. Aliás, note-se que os centros de decisão das empresas presentes em portugal estão localizadas em espanha, pelo que também pelo lado empresarial isto não será fácil de concretizar.
Quanto à adequação do sistema financeiro: Parte-se do princípio que o crescimento com base no endividamento só é sustentável se o crescimento for superior aos custos dos juros e capital do endividamento. Ora os critérios têm que ser objectivos e auditáveis. Na prática vai contra os interesses existentes nos municipios, porque como é evidente a maior parte dos projectos só têm crescimento no papel do projecto, na realidade, tornam-se insustentáveis porque as ponderações dos estudos de viabilidade económico-financeira, não são figuedignas, designadamente por via da empolação dos benefícios.
Um abraço,
Daniel Conceição
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