Domingo a Grécia vai a votos novamente, apenas 8 meses depois das últimas eleições que deram a vitória à extrema esquerda. Vamos ver qual vai ser a escolha dos gregos, quando após 8 meses de governação syrizica, o país está claramente pior que em Janeiro.
Mas se Tsipras contribuiu fortemente para afundar ainda mais a Grécia, que apesar de tudo registava no final do ano passado sinais de crescimento, a verdade é que a tragédia grega começou muito antes. Será possível continuar a governar um país assim? Será possível ao Syriza continuar a esconder as verdadeiras razões da crise grega? Porque é que durante estes 8 meses nunca o Syriza aceitou que são os gregos e só eles o culpados pelo estado em que se encontra o país, colocando as culpas todas nos seus parceiros europeus, que tudo fizeram (e estão a fazer) para ajudar o povo grego?
Um texto que em 10 pontos resumidos e numa linguagem clara, mostra porque é que em tão pouco tempo a Grécia vai para o terceiro resgate financeiro:
«A Grécia é não só um país falido, mas também uma das economias mais pobres e menos desenvolvidas da Europa desde há décadas. E isto, curiosamente, seguindo os ditames da esquerda radical - posto que o Estado grego caracterizou-se por ser um dos mais intervencionistas da Europa (estava no 100º lugar mundial da fragilidade de fazer negócios quando começou a crise do euro) e com um dos mais elevados níveis de gastos públicos.
A origem da tragédia grega, ao contrário do que defendem o Syriza e o Podemos, não reside na austeridade, mas sim no enorme e insustentável setor público. A Grécia foi o país da UE que mais aumentou o seu gasto público real (cerca de 80% entre 1996 e 2008) e a sua divida pública (400% superior à receita pública de 2011) desde os felizes anos da bolha de crédito. Mas estes grandes números, sendo relevantes, traduzem-se também em factos muito concretos, cuja realidade ocultam habilmente os partidos como o Syriza ou o Podemos em Espanha.
Em seguida, resumem-se as dez grandes vergonhas Gregas que a esquerda europeia se nega a reconhecer. A ruina grega é uma história cheia de mentiras, desperdícios e uma enorme hipocrisia.
1 – Mentiram sobre o défice público
O primeiro facto a assinalar é que os políticos gregos ocultaram o seu défice público real durante anos. Quando o novo governo chegou a Atenas em 2009, encontrou-se com um perdão fiscal correspondente a 14% do PIB, em oposição aos dados oficiais de Bruxelas que era de 3.7%.
De um dia para o outro, o défice passou de 7000 para 30000 milhões de euros, quase quatro vezes mais. Este manifesto embuste evidencia a enorme irresponsabilidade política dos diferentes governos gregos.
2 – Atenas recorreu à banca de investimento
A esquerda descarrega constantemente contra os mercados, em geral, e a malvada banca de investimento, em particular, mas esquecem-se que a sua admirada Grécia recorreu aos financiamentos de Wall Street para ocultar as suas contas desastrosas.
O anterior governo presidido por Yorgos Papandreu reconheceu que a Grécia mentiu nas contas do défice e da dívida para entrar no euro, oferecendo dados falsos até 2009, valendo-se, entre outros, dos serviços da Goldman Sachs. Com isto assinala-se que o actual Presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi, dirigia as operações da Goldman Sachs na Europa em 2002, quando a Grécia iniciou as suas operações fraudulentas de engenharia financeira.
3 – O Estado causou a falência da banca
Outra verdade é que, no caso da Grécia, a falência da banca grega foi responsabilidade direta do Estado grego, e não o contrário. As entidades bancárias foram encarregadas da dívida pública grega durante os anos da bolha para financiar o enorme e sumptuoso gasto de diversos governos. Por isso, a banca grega entrou em falência quando se removeu 50% dos títulos gregos nas mãos dos credores privados em 2011, após o acordo do 2º plano de resgate da Troika.
Posteriormente, a Europa teve de injectar dinheiro extra para salvar os depósitos gregos. Isto é, os depositantes gregos foram resgatados com o dinheiro dos contribuintes europeus através da Troika, depois da insolvência de Atenas, que arrastou a banca para a falência.
4 – Vida a correr bem, mas com dinheiro dos outros
Durante a bolha a Grécia viveu muito acima das suas possibilidades reais, recorrendo a uma prodigiosa dívida pública para poder financiar esse nível intolerável de gastos. Mais de metade da economia grega dependia, de uma ou outra forma, do maná estatal, criando assim uma grande estrutura clientelar à base de “jobs for the boys”, corrupção, subvenções.
Seguem alguns exemplos:
• Durante anos, e tendo um PIB per capita muito inferior ao de Espanha, o salário mínimo grego era 50% superior.
• Durante décadas, quando um partido chegava ao poder colocava pessoas no sector público a troco dos seus votos, acrescentando de forma insustentável a pandilha estatal.
• O Hospital Evagelismos, um dos principais de Atenas, por exemplo, chegou a ter 45 jardineiros para cuidar de quatro jarras na sua entrada; alguns organismos públicos contavam com 50 condutores por carro, um antigo ministro da agricultura criou uma unidade não contabilizada de 270 pessoas para digitalizar as fotografias das terras públicas gregas, sem que nenhum dos contratados tivesse experiência na fotografia digital, pois eram carteiros, cabeleireiros, agricultores e em geral filiados no partido…
• O gasto em educação, saúde e políticas sociais, foi de longe a que mais aumentou até ao estalar da crise da dívida, superando os 31% do PIB em 2012.
• Além disso, a Grécia, essa grande referência da esquerda radical, era o país da UE que mais dinheiro destinava a gastos militares antes da crise, com uma média superior a 4% do PIB.
5 – Excesso de funcionários e ineficiência
O emprego público é, sem dúvida, um dos grandes paradigmas do desastre grego.
– Durante a bolha, Atenas nem sequer sabia quantos empregados tinha; os sindicatos estimavam uns 700 mil, enquanto o governo falava de 800 mil; mas se somarmos os contratos a termo, o valor superou um milhão de pessoas em 2007, equivalente a 10% da população e quase 20% da força laboral do país.
– Ganhavam em média 1350 euros mensais, superando o salário médio existente do sector privado. Mas o relevante era que o lucro dos funcionários públicos era muito maior: além de receberem 2 salários extra, recebiam bónus e recomendações adicionais citando todo o tipo de desculpas, como chegar ao trabalho no tempo previsto, apresentar-se correctamente vestido, usar o computador ou falar línguas. Os guardas florestais, por exemplo, recebiam um bónus por trabalharem ao ar livre.
– Somando todos esses extras, os funcionários públicos gregos chegavam a receber de média mais de 70 mil euros anuais, enquanto os alemães recebiam 50 mil euros anuais.
– Mesmo assim, os funcionários também recebiam uma pensão vitalícia de 1000 euros mensais para as filhas solteiras de empregados falecidos, entre muitos outros privilégios e regalias.
– Grécia tinha quatro vezes mais professores que a Finlândia, o país que melhores notas tinha nos exames de PISA referentes à qualidade educativa, mas essa superabundância de docentes só serviu para o país estar entre os piores países com pior nível de ensino da Europa. Muitos gregos que enviavam os seus filhos para escolas públicas, tinham que contratar professores particulares de reforço.
– Outro dado curioso é que na Saúde Pública a Grécia era a que mais gastava em consumos intermédios, superando a média da UE, sem que os gregos tivessem mais doentes que os restantes europeus. Motivo? Um dos muitos escândalos destapados durantes os últimos anos era a tradição entre médicos e enfermeiros de sair dos hospitais carregados com todo o tipo de material higiénico e sanitário.
6 – Empresas públicas, o cúmulo do desperdício
No entanto, para além do número desproporcionado de funcionários públicos, os seus salários ou a grave ineficiência dos seus serviços era a sua superdimensionada estrutura estatal, tendo centenas de empresas, organismos e entidades inúteis. Basta assinalar alguns exemplos para nos apercebermos do absurdo:
• O salário médio da Renfe [equivalente da REFER portuguesa] grega, chegou a superar os 70 mil euros anuais, incluindo profissões de baixa qualificação. A sua receita operacional rondava os 100 milhões de euros anuais, enquanto os seus gastos superavam os 700 milhões.
• “Há vinte anos atrás, um próspero empresário chamado Stefanos Manos, nomeado depois ministro das finanças, sugeriu que seria mais barato colocar todos os passageiros das linhas férreas gregas em táxis – continua a ser verdade.”, tal como detalha Michael Lewis no seu livro: “Boomerang: Travels in the New Third World”, onde se explica parte dos excessos gregos cometidos durante a borbulha.
• O orçamento do metro de Atenas rondava os 500 milhões de euros anuais, e ganhava com a venda de bilhetes apenas 90 milhões.
• A Grécia também criou um comité para gerir o Lago Kopais, mesmo estando seco desde 1930.
• Após o resgate da Troika, Atenas anunciou a eliminação ou fusão de 75 organismos públicos, em que trabalhavam mais de 7 mil pessoas, e que anualmente recebiam cerca de 2700 milhões de euros (uns 386 mil euros por empregado).
7 – Reformas douradas
Até ao estalar da crise, os gregos podiam-se reformar pouco depois dos 61 anos, recebendo cerca de 96% do seu salário, sendo um dos sistemas de pensões mais generoso e insustentável da UE.
Na Grécia existiam cerca de 600 categorias laborais, que alegando motivos de saúde, poderiam optar pela reforma antecipada, estabelecida para os homens aos 55 anos e para as mulheres aos 50 anos. E entre estes últimos beneficiados havia todo o tipo de profissões, desde cabeleireiros até trompetistas, flautistas, cozinheiros, massagistas e incluindo apresentadores de TV, entre outros.
Precisamente por isso, os gregos beneficiavam da maior esperança de vida após a reforma, não por viverem mais anos, mas por se reformaram antes. Em concreto, ao passo que a média da OCDE era de 18.5 anos, os gregos disfrutavam de 24 anos da existência plácida da reforma, sustentada por um crescente volume de dinheiro emprestado em forma de dívida pública.
Além disso, o controlo sobre a gestão das pensões era inexistente. Durante a crise, detectaram-se milhares de familiares que recebiam reforma depois dos seus titulares terem falecido, ou recebiam certas prestações sem terem direito a elas.
8 – Subornos e evasão fiscal
A Grécia destaca-se também por liderar todos os indicadores europeus de evasão fiscal. Antes da crise, um em cada quatro trabalhadores não pagavam nada de impostos, de modo que os cofres públicos deixavam de receber entre 15 mil a 20 mil milhões de euros ao ano.
Antes da crise, cerca de 5 mil gregos declaravam que recebiam mais de 100 mil euros por ano – isto numa população de quase 12 milhões. Lewis explica no seu livro que dois terços dos médicos não pagavam um único euro em impostos, pois nos seus rendimentos declaravam menos de 12 mil euros anuais.
Os subornos estavam na ordem do dia. Alguns estudos lembram que os gregos gastavam cerca de 800 milhões de euros em subornos, para evitar o pagamento de multas ou para que os funcionários fechassem os olhos, incluindo os inspectores fiscais. Para termos noção, o ministério das finanças despediu, há escassos anos, 70 funcionários com um ativo imobiliário médio de cerca de 1.2 milhões de euros, quando o seu salário não superava os 50 mil euros anuais.
Outro dado alarmante é que o número de trabalhadores por conta própria na Grécia era dos mais elevados da UE, não por serem especialmente empreendedores, mas pela facilidade de ocultarem dados do Fisco. Como se isso não bastasse, em anos eleitorais, como em 2009, a recolha de impostos baixava de forma substancial (cerca de 30% do PIB), pois os políticos a nível local perdoavam impostos com o objectivo de arrecadarem votos.
9 – Dívida pública exagerada
Como consequência desta farra de gastos e crescimento estatal, o país financiou-se emitindo dívida. A Grécia foi o país que mais recorreu à dívida privada durante a época da bolha financeira e com isso a sua factura anual de juros era cerca de 12% da receita pública até ao 2º resgate (em 2011 antes do resgate, chegou aos 17%), no entanto na Alemanha o valor era de 6%.
10 – Podem pagar, mas não querem
Syriza e Podemos reclamam agora um novo corte da dívida soberana, mesmo que o Estado grego se tenha endividado voluntariamente para cometer todos os excessos descritos anteriormente – em vez da Grécia assumir a responsabilidade e pagar o que deve.
Mesmo que muitos digam que é impossível, é certo, segundo o BCE, que Atenas possuiu uma enorme carteira de ativos públicos, estimada em cerca de 300 mil milhões de euros, incluindo empresas, infraestruturas, ações, participações, solo e todo o tipo de bens. A Grécia também podia vender ilhas, praias, ouro, e até monumentos, se fosse necessário, com a meta de cumprir os seus compromissos e evitar o doloroso estigma da falência e possível saída do euro.
Não seria necessário chegar tão longe, bastava que Atenas reduzisse o peso do Estado para metade (uns 60 mil milhões de euros) com a privatização das pensões, saúde e educação, e vendesse 50% dos seus ativos (outros 100 mil milhões por baixo), e a sua dívida ficaria a cerca de 70% do PIB. Além disto, unido ao compromisso do equilíbrio das contas públicas (défice zero) e um ambicioso plano de reformas para liberalizar a economia e baixar os impostos, poderia reduzir ainda mais o seu endividamento a médio prazo por via do crescimento económico. A Grécia pode pagar, só que não quer, e tudo indica que não pague.»
* Tradução do texto inicialmente publicado no LibreMercado por M. LLamas, e traduzido por Jóni Coelho e publicado por Rui Santos.
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